APRESENTAÇÃO
O cenário perturbador de um ano atípico, fruto da pandemia ora em curso, de efeitos catastróficos globais, e diante das incertezas, levou a suspensão da feitura do XXVIII Congresso Brasileiro de Médicos Escritores, então previsto a ter lugar em Fortaleza, de 3 a 5 de setembro de 2020.
Um ponto nevrálgico subjacente residiu na proposição solitária de se suspender a publicação da antologia deste ano, diante da vigência imprevisível da pandemia, porém tal propositura foi majoritariamente rechaçada, o que evitou a solução de continuidade da série que teve o seu começo em 1981.
Sabia-se, de antemão, que o processo de coleta dos escritos seria um pouco mais dificultado, já que alguns sobramistas poderiam ser menos afeitos às atividades digitais enquanto outros estariam na linha de frente do combate à pandemia, restando curto tempo para se dedicar à produção literária, além dos possíveis transtornos
psicológicos inibitórios da inspiração.
Por outro lado, de forma compensatória, o distanciamento social liberou alguns sócios para que pudessem dispor de mais tempo para afazeres culturais, cultivando o hábito da leitura e fermentando ideias que foram transpostas no papel. Nesse sentido, houve colegas sobramistas que bem aproveitaram o isolamento a que foram sujeitos para escrever e atualizar obras, divulgando sua produção intelectual no Blog da Sobrames/CE (Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – Regional Ceará) e nas mídias sociais.
A despeito de tudo isso narrado acima, a sequência de Antologias da Sobrames/CE alcançou, em 2020, a sua 37ª edição, exibindo robustez e consistência comprovadas, com qualidade literária, servindo para emular a aproximação de novos escritores médicos que se associam à nossa entidade.
Sob o título “Sopro de Luz”, a nova antologia contou com 70 participantes, dos quais 17 incluíram produções relacionadas com o tema da Covid-19, ensejando o interesse de compor uma coletânea específica da pandemia que nos assola. Como alguns sobramistas, adicionalmente, publicaram outros trabalhos sobre a Covid-19 no Blog da Sobrames/CE e no Jornal do Médico Digital, veículo que mantém estreita parceria institucional conosco, considerou-se oportuno enfeixar esses produtos no livro em epígrafe, o que possibilitou agregar mais seis sobramistas, perfazendo os 23 autores, que responderam por 60 contribuições.
A obra, composta por distintos gêneros literários, tanto em versos como em prosa, tem prefácio elaborado pelo presidente da Sobrames/CE, o médico e escritor Arruda Bastos, que, de forma continuada, redigiu o seu diário da quarentena, divulgando as crônicas produzidas no Blog da Sobrames/CE e nas mídias sociais.
Em princípio, esta publicação foi programada para ser editada no formato de e-book, de livre acesso público, sob o selo editorial da Editora da UECE, por não se ter interesse comercial em venda de exemplares avulsos. A diagramação segue o padrão das antologias da Sobrames/CE, com os trabalhos sequenciados por autor, e aproveita as minibiografias dos autores recentemente atualizadas.
Que os escritos desta coleção amenizem as más lembranças de um tempo de pandemia que tanto maltratou a nossa humanidade.
Fortaleza, 1º de novembro de 2020
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Sócio da Sobrames/CE e Editor
PREFÁCIO
Iniciando o prefácio deste magnífico livro, transcrevo um trecho de um ensaio que escrevi em 2016, de título “O escritor tanto é iluminado quanto ilumina”, que diz “A sensibilidade dos médicos para a literatura vem, em grande parte, da prática diária da nossa profissão. O contato com a linha tênue que separa a vida da morte, o sofrimento, o contraste da alegria de uma nova vida que nasce ao desespero de outra que parte ou se acorrenta a uma doença terminal. O jogo da vida entre diagnósticos positivos e negativos, a avaliação de sobrevida e os prognósticos. Nenhuma outra profissão tem interseção com tão amplo espectro de sentimentos”.
Foi assim, ainda impactado e vivendo as agruras dessa pandemia da Covid-19, ao ler os originais dessa obra, que o valoroso escritor, editor e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – Regional Ceará (Sobrames/CE), Marcelo Gurgel, fez chegar às minhas mãos, que senti a certeza das afirmações do meu humilde ensaio. A obra em epígrafe foi forjada nos mais nobres sentimentos e inspirações de 23 médicos escritores da nossa Sobrames/CE, formatada com 60 textos (em versos e em prosa) produzidos pelos nobres confrades e confreiras nos últimos meses e publicados durante o período mais crítico da pandemia de Covid-19 no Ceará.
A Sobrames é uma entidade literária nacional, fundada em 1965, e das mais conceituadas do Brasil. A nossa Regional, com 38 anos de existência, detém o reconhecimento por sua produção literária e qualidade dos seus integrantes. O Jornal do Médico, com 15 anos de atuação, é grande difusor de nossas produções. Ainda, o nosso Blog conta com um repositório de acervo de grande qualidade e também com nossas tradicionais e inebriantes antologias: as joias da nossa coroa. A desse ano, intitulada “Sopro de Luz”, é a confirmação de que foi inspirada na famosa frase do livro “Os Sertões” de Euclides da Cunha, no qual ele diz que “o sertanejo é, antes de tudo, um forte”. A partir desta frase, tiramos uma licença poética para fazer uma pequena alteração. O cearense da Sobrames/CE é, antes de tudo, um forte. Essa obra é o resultado da união de todos esses parceiros.
Ao iniciar este prefácio, fiquei dividido entre falar como escritor e colaborador da obra ou convidado. Vou tentar fazer as duas coisas, embora saiba que não será fácil devido à qualidade da obra e pelo sentimento que me aflora o espírito, pois sinto-me picado pela mosca azul”, inspirado no poema “Mosca Azul”, de Machado de Assis,
que conta a história de um plebeu que, ao encontrar uma curiosa mosca azul, com “asas de ouro”, deslumbra-se e passa a sonhar com predicados inatingíveis, ilusão que acaba comprometendo sua sanidade e seu senso de realidade.
A presente obra, escrita a vinte três mãos, conta com diversos gêneros literários, sempre com temas tratando da pandemia e abordando de forma incomparável inúmeras facetas desse período histórico, e ainda tratando de forma única o difícil momento que vivenciamos. São abordados temas como amor, ética, ciência, história, economia, aspectos sociais e, como ninguém é de ferro e cearenses que somos, também humor.
Não vou dar spoiler, só digo que devorei as páginas dessa obra inicialmente de um fôlego só, depois voltei para degustar, agora com paciência, e me deliciar ao absorver seu conteúdo literário e histórico em um impressionante redemoinho de emoções.
Digo que, no final, fiquei mais leve, com o espírito inebriado, com as poesias e prosas; mais culto e informado com os dados históricos; mais crítico com os questionamentos levantados; e com mais responsabilidade por, no momento, presidir a Sobrames – Regional Ceará, uma entidade com tantos confrades e confreiras ilustres. O panorama ainda é assaz assustador e a possibilidade de uma segunda onda, como já caracterizada na Europa, uma possível realidade. O mais importante é pensar que tudo vai passar e que o melhor a fazer é aproveitar esse momento para repensar
valores, o modo de vida e aferir o nosso grau de resiliência. Durante o isolamento, escrevi o livro “Diário de uma Quarentena”, com 150 crônicas marcando os primeiros cinco meses de distanciamento social. Digo que foi uma terapia e a tábua de salvação que me deixou no prumo, apesar da ansiedade e da perda, para uma outra dimensão,
de muitos clientes, amigos e até parentes.
O período tem sido fértil em lembranças do passado, novas posturas do presente e esperança no futuro que a humanidade vai herdar: novas vacinas, avançados estudos científicos, uma nova ordem social e econômica. Em breve, tudo será história, e todos nós, escritores ou não, políticos, autoridades, leitores como vocês e o povo em
geral, vamos ser responsáveis pelo futuro que há de vir.
Para concluir, acostando-me novamente ao ensaio que escrevi em 2016 que diz “Pablo Picasso, famoso pintor espanhol, dizia que há dois tipos de artista: os que transformam o sol numa simples mancha amarela, e aqueles que fazem de uma simples mancha amarela o próprio sol. Nós, médicos escritores, sem dúvida, integramos o rol dos que transformam manchas amarelas em sois, escritos em bálsamo para os aficionados por uma boa leitura”. Sem dúvida, esse livro foi um bálsamo para o meu coração e será, com certeza, para todos vocês.
Fortaleza, 1º de novembro de 2020
Raimundo José Arruda Bastos
Presidente da Sobrames Regional/CE e Nacional
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